Um canal de TV infantil é socialmente útil?

Prof. Valerio Fuenzalida
Faculdade de Comunicações
Pontificia Universidad Católica de Chile
Artigo originalmente publicado em “El Mercurio” – 12-08-2016. P. A2

Quando o atual governo se propõe a planejar o projeto de um canal de IV infantil, é necessário analisar o seu valor socioeducativo. A análise possui dois aspectos: um deles é a mudança na concepção acadêmica da criança-audiência e o segundo é a importância de se perguntar sobre a qualidade educativa na TV infantil. Com o conhecimento buscado pela neurociência da criança, abandonou-se a perspectiva condutora de uma criança internamente vazia. A neurociência verificou a capacidade interna da criança, a educação é o desenvolvimento das competências internas da criança, entre elas, a inteligência emocional postergada pela educação convencional. Outras bases acadêmicas que influíram em uma nova relação com a criança são os conhecimentos acerca das etapas de desenvolvimento evolutivo, a fruição do entretenimento no jogo e a ficção, e a atividade construtivista na aprendizagem.

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Valerio Fuenzalida, em oficina oferecida durante a 2a versão do Diplomado Internacional en Contenidos Audiovisuales para público infantil, realizado na Universidad Santiago de Cali, Colômbia.

Os novos conhecimentos impulsionaram a criação de novos programas infantis de TV e de canais infantis segmentados, que começam a aparecer desde o final dos anos 90. A revisão de algumas dezenas desses novos canais infantis e dos novos programas emitidos permite formular dez novos critérios de qualidade na TV infantil. 1) Qualidade é hoje a criação de canais segmentados para a criança, com a identidade de um canal infantil. As crianças se mudaram para esses canais, abandonando as faixas na TV generalista. O horário aproximado vai das seis às 22 horas e o horário restantes é programado por um sinal cultural ou juvenil. 2) A qualidade é colocar as crianças no centro do canal como programação e como audiência, isto é: o foco não são funcionários de agências nem capacitação de professores, nem interesses comerciais. 3) Qualidade é a Emissão / recepção em multiplataforma com Video on Demand e Streaming (recepção ubíqua, em dispositivos diversos e a qualquer momento) e com realizações multigenéricas (canções, adivinhações, quebra-cabeças, humor e outros). 4) Qualidade é a realização / programação segmentada por idades segundo a evolução do desenvolvimento infantil em motivações internas e em competências perceptuais.

Na realização dos programas, aparecem outros cinco novos critérios de qualidade. 5) Qualidade é propor interatividades do programa em tela com a criança-audiência; busca-se romper o espetáculo e voltar ativo à criança-audiência com desafios e capacidades cognitivas e perceptuais. 6) Qualidade é representar a criança-audiência dentro do programa, como alguém hábil e competente; com as capacidades internas sócio emocionais, tais como criatividade, imaginação, curiosidade, desafio às suas competências, protagonismo ativo na direção da obtenção de metas, identidade da diversidade pessoal e outras. 7. Qualidade é produzir programas lúdicos e de entretenimento revalorizando o formato narrativo da fábula ficcional e as emoções positivas das crianças na base do aprendizado. 8. Qualidade educativa nessa nova TV é contribuir ao desenvolvimento das competências internas da criança como atividade, autonomia, autoconfiança, autoestima, colaboração grupal na diversidade, autoanálise, resiliência diante dos problemas e adversidades. Aparece aqui o aporte sócio emocional da nova TV, próprio, mas complementar ao aporte cognitivo da escola.

A nova conceptualização da TV valoriza o nível da recepção pela audiência. 9. Qualidade é fortalecer a recepção construtivista nas salas de primeira infância, com o apoio das professoras. A atividade construtivista das crianças na sala se mostra indispensável para a interpretação da significação da história, para a aquisição de independência e para a seletividade diante dos programas televisivos. 10. Também desde a recepção, outro critério de qualidade é propor o aporte do lar para a conversa construtivista familiar com as crianças e construir confiança sócio familiar em direção a um canal.

Com esses novos critérios de qualidade, um canal público infantil pode ter um valor social massivo, uma vez que contribui para a qualidade da educação, em particular à qualidade da educação de primeira infância. É preciso recordar que hoje se estima que a cobertura e a qualidade da educação de primeira infância é o investimento mais rentável em educação.

Contato do autor: Valerio Fuenzalida – [email protected]
Imagem do destaque: Valerio Fuenzalida, extraída da página web da Pontificia Universidad Católica de Chile. goo.gl/mB3T8y

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